quarta-feira, 2 de abril de 2014

Missão anjo da guarda: capitulo 7:Enfrentando o demônio


Passei o último mês vivendo o meu pior pesadelo. Não adiantava mais fingir que aquilo não estava acontecendo ou era uma piadinha de mau gosto que logo iria acabar, pois há aquela altura já estava claro que não.  Já tinha chorado, esperneado, perdido a todos os anjos superiores e de nada adiantou. Eu era um anjo da guarda agora e ponto.
Proteger Pedro era de longe a coisa mais fácil do mundo. Ele era briguento, irresponsável, possuía todos os tipos de inimigos imagináveis. Como se isso já não fosse o bastante ainda havia o demônio dentro dele com o qual eu não sabia lidar, e que me impedia de tocar no garoto sem que eu o machucasse.
Se você acha que ser anjo é uma coisa legal, é porque nunca se imaginou no meu lugar. Oh mundo cruel, ainda tinha certeza de que não merecia aquilo.
– Isabela! – ouvi alguém gritar batendo na minha porta. – Isabela, acorda ou vamos nos atrasar para aula. – Pedro não parava de berrar do outro lado.
– To indo. – resmunguei sem querer me levantar.
Droga! Como eu odiava aquilo.
– Isabela! – ele insistiu
Ah, até que ele era um humano legal... Ahmmm? No que eu estava pensando? Ele é só um humano inferior.
– Isabela!
– To indo!!!
Saltei da cama e corri para o banheiro pegando uma muda de roupa no caminho. 15 minutos depois eu abri a porta do quarto e ele esta lá, escorado na parede, olhando para mim. Por um breve instante ele pareceu um garoto normal, como se não houvesse uma criatura perversa habitando o corpo dele.
– Achei que não iria sair nunca. – ele resmungou caminhando pele corredor e eu o segui.
Ignorei o comentário dele.
– Você é sempre assim? – ele parou de andar e se virou para mim.
– Assim como?
– Tão arrogante.
– Não sou arrogante.
– Imagina. – ele disse sarcástico e voltou a andar. – Ah – ele parou novamente. – Trouxe o seu café senhorita altruísta. – ele me estendeu um saco de papel marrom.
Nossos dedos se cruzaram por um breve segundo, ele tirou a mão como se tivesse encostado em uma panela quente. Seus olhos ficaram negros por um breve segundo.
– Já ouvi casos de pessoas que tomam choque ao encostar em outras. Mas isso é estranho. – ele resmungou.
– Vai saber o porquê, nunca fui muito boa em física mesmo. – desconversei, dando uma mordida no pão com queijo que ele me trouxe.
Ele começou a rir.
– O que foi? – perguntei sem entender o motivo da graça.
– A senhora perfeita admitiu que não é boa em alguma coisa.
Fechei a cara e ele continuou a rir.
Caminhei até a escola, ao lado dele, em completo silêncio. Estava pensativa. Será que eu era mesmo assim? Bobagem! Eu era um anjo, uma criatura divina, perfeita.
– Olha só quem vem ali. – resmungou um dos valentões da escola quando nos aproximamos. – Pedro e a namoradinha dele.
– Ela não é minha namorada. – Pedro rosnou.
– Oh, se é assim . – disse o garoto que deveria ter vinte e poucos anos, era alto, gordo, usava um boné para trás, roupas surradas e fedia como uma caçamba de lixo. Ele se aproximou de mim até ficar a poucos centímetros. – ela pode ser A MINHA namorada.
Pedro segurou a mão do cara no ar, antes que a mesma me tocasse.
– Tire suas mãos imundas dela. – Pedro rosnou.
– Ou o que? – o encrenqueiro desafiou em meio a uma gargalhada.
– Você não sabe do que eu sou capaz. – a voz de Pedro soou grave e assustadora. A partir dos olhos dele começaram a sair manchas negras que foram tomando conta do seu rosto.
Os curiosos que assistiam saíram correndo com medo. O cara tentou fazer o mesmo, no entanto Pedro segurava o seu braço com uma força descomunal.
– Pedro, ei Pedro, calma. – tentei interferir.
– Cala a boca, anjo! – ele rosnou em minha direção.  Seus dentes estavam pontudos e assustadores.
Há aquela altura o encrenqueiro já havia feito xixi nas calças. Eu era capaz de apostar que ele pensaria centenas de vezes antes de mexer com alguém novamente.
Sabia que Pedro não estava mais no controle, aquele a minha frente era o demônio.
– Você pode lutar Pedro! Você pode escolher.
– Cala a boca! – o demônio gritou novamente.
– Eu não tenho medo de você. – disse olhando-o nos olhos.
– Deveria ter. – ele soltou o cara e andou na minha direção.
O garoto saiu correndo como um cometa, sem nem ao menos olhar para trás.
Estávamos sozinhos, um Pedro inconsciente, o demônio e eu.
– Você só aparece quando ele perde o controle. – comecei a dizer. – Sabe muito bem que se ele quiser pode lutar contra você.
– Isso é mentira! Eu sou um demônio, mais forte do que qualquer humano medíocre.
Foi a minha vez de rir. Havia menosprezando os humanos toda a minha existência e estava ali dizendo para um demônio que a mesma criatura que eu julgava inútil era mais forte que ele. Foi engraçado. E por mais engraçado que fosse eu acreditava naquilo.
Permaneci olhando profundamente nos olhos de Pedro. Sabia que ele estava ali em algum lugar. Costumava ouvir que os olhos eram a janela da alma, mas como essa era uma dádiva apenas dos humanos eu não tinha certeza.
– Pedro você pode, lute contra ele.
Abri as minhas assas e deixei que a minha luz tomasse conta do ambiente ao meu redor.
– Vá embora, anjo enxerida! – o demônio berrou.
–Isabela! – ouvi a voz de Pedro ecoar baixinha. – Isabela!
– Não! –o demônio berrou.
A voz do mesmo foi se perdendo e a de Pedro se tornando mais forte.
Aquela luta pareceu interminável, até que os olhos de Pedro voltaram ao normal e eu soube que ele estava ali novamente. Mais forte, vitorioso!
– Isabela, você... eu? – ele me encarou surpreso enquanto eu recolhia as minhas asas.
– Longa história. – resmunguei.
– Não to a fim de assistir as aulas de hoje mesmo.
Virei às costas comecei a andar, ele me seguiu. Acabamos sentando as margens de um rio.
Permaneci em silêncio, não sabia o que podia ou não contar para ele, porém
Achava que ele merecia saber.
Contei “Ei, tem um demônio dentro de você” e “Eu sou um anjo” da forma mais fácil que consegui. No fim do meu discurso ele estava me olhando com os olhos esbugalhados em um misto de surpresa e incredulidade. Reação dentro do esperado.
– Você quer dizer que toda vez que eu apagava e não lembrava de nada depois era porque um demônio tomava conta do meu corpo?
– Basicamente.
– Caramba! – ele estava chocado demais para dizer qualquer coisa.
– Acho melhor irmos trabalhar. – foi a melhor coisa que consegui dizer.
– Ta bem. – ele concordou e começou a andar. – Mas se você é um anjo por que não simplesmente cria dinheiro? –perguntou curioso.
– Já me fiz a mesma pergunta, mas não funcionou. – lamentei.
Não conversamos muito durante o expediente. Acho que ele precisava de tempo para digerir tudo aquilo. Se não tivesse visto com os próprios olhos jamais acreditaria em mim.
Quando voltei para o meu quarto, na pensão barata e abri a porta tomei um grande susto.
Havia um anjo de pé ao lado da minha cama.
Engoli seco.  Comecei a me perguntar mentalmente qual era a punição pior do que me tornar um anjo da guarda.


Continua...


By Ashe 

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