Havia
a muito tempo atrás, uma rica família, que vivia numa casa muito
grande. O homem era um comerciante, casado com a filha de um
fazendeiro. Eles tinham dois filhos: O mais velho se chamava Kameo e
a mais nova, a princesinha da casa se chamava Okiri.
Os
irmãos eram muito ligados; Kameo passava horas brincando com a irmã,
sempre que podia. Quando atingiu certa idade, seu pai começou a
leva-lo para o trabalho com ele, para que o garoto aprendesse os
negócios da família o quanto antes, deixando a pequena sozinha a
maior parte do dia. As vezes, Kameo e o pai chegavam em casa muito
tarde, e a menina já tinha ido dormir.
Numa
manhã, Okiri acordou e viu uma carta ao seu lado; era dos eu
irmãozão. Ele tinha deixado para ela na noite passada. Na carta ele
dizia o que estava fazendo no trabalho e como sentia a falta dela.
Okiri ficou tão feliz que resolveu fazer o mesmo e deixou uma
cartinha para ele, sobre a cama dele. A troca de cartinhas virou
costume, e assim, mesmo não se vendo tanto, Okiri não se sentia tão
sozinha.
Infelizmente, em 1932,
aos 8 anos, Okiri ficou muito fraca por causa de uma doença
misteriosa que medico algum sabia dizer o que era. Kameo tentava
passar o maior tempo possível com a irmã, sempre lhe dizendo que
logo ela ficaria bem. Mas ele sabia da verdade, não havia cura para
Okiri e a cada dia, ela ficava pior, mas nunca deixava de sorrir,
sempre que o irmão chegava em casa.
Alguns meses depois, a
criança morreu. Seu corpo foi cremado junto com todas as cartinhas
que tinha do seu irmão. A família ficou muito triste; a mãe
chorava muito, o pai passou a beber e o irmão, ficava horas sozinho,
lendo e relendo as cartinhas deixadas pela irmã, onde contava o que
ela fazia em casa o dia todo quando ele não estava.
O
quarto da menina continuava intocado, suas roupas e seus brinquedos e
suas bonecas. Numa noite, quando estava sem sono, o rapaz teve a
ideia de organizar as bonecas na prateleira. As bonecas eram feitas
de madeira e todas vestiam quimonos muito bonitos. Com paciência,
Kameo arrumou todas as bonecas de modo que ficasse alinhadas. Quando
terminou ele estava para sair do quarto quando resolveu dar uma
ultima olhada nos quimonos da sua irmã e foi ai que ele teve uma
grande ideia: iria contratar o construtor de bonecas para lhe pedir
uma boneca que tivesse exatamente o mesmo tamanho de Okiri, com
cabelos do mesmo comprimento e olhos de vidro, seria perfeito!
Vestiriam ela com as roupas da garota, e ela seria imortalizada como
uma verdadeira boneca, a maior de todas.
No dia seguinte, o rapaz
fez o pedido da boneca e em menos de um mês, lá estava ela: vestida
e penteada como Okiri, de joelhos em uma almofada, cercada por todas
as outras bonecas. Todas as noites antes de ir dormir, Kameo abria a
porta do quarto e dava boa noite à boneca. Numa noite em particular,
quando abriu a porta, notou que a cabeça da boneca estava numa
posição um pouco diferente do que de costume. Ficou furioso; alguns
dos empregados deve ter tocado nela. Entrou no quarto e arrumou-a
como deveria ser. Quando estava saindo, notou que a mão dela
movia-se lentamente, fechando e abrindo os dedos. Deu um pulo com o
susto; olhou bem para a boneca, que não mais movia os dedos.
Bobagem, pensou, fechou a porta e foi para o quarto.
Quando foi deitar-se,
viu que havia uma pedacinho de papel branco dobrado em sua cama.
Abriu-o e era uma cartinha escrita com a letra de Okiri: "
Kameo, não!". Ele tinha certeza que nunca havia visto aquela
carta antes, talvez estivesse perdida e algum dos empregado a achou e
colocou sobre sua cama para que ele pudesse guardar com as outras.
No outro dia, logo que
acordou, Kameo encontrou outro papel dobrado sobre sua coisas. A
letra também era igual a de Okiri, mas desta vez, parecia que havia
raiva na escrita, as letras estavam maiores: " Eu não sou
ela!".
Amassou o papel com
raiva, alguém estava brincando com ele. Se vestiu e saiu para ir
trabalhar, e ao passar pela porta do quarto da irmã, ouviu um
barulho lá dentro, como se fosse algo caindo no chão. Abriu a porta
e viu a boneca grande caída. Com paciência, ajeitou-a na almofada
como sempre. Foi até a porta do quarto, e pelo espelho, viu a boneca
levantar o rosto e olhar para ele com seus frios olhos de vidro. Deu
um grito e olhou para trás: a boneca estava como ele havia deixado.
Olhou mais uma vez para o espelho... estava tudo ok. Trancou a porta
do quarto da menina e levou a chave consigo para o trabalho.
Naquela noite quando
voltou pra casa, sua mãe lhe disse que os empregados ouviram
barulhos estranhos no quarto dele durante a tarde. Ao entrar em seu
quarto, Kameo se deparou com uma mensagem escrita na parede " Eu
odeio aquela boneca! eu não sou ela!"
Agora a coisa estava
séria: ou alguém tava muito afim de morrer ou... Deu uns tapas no
próprio rosto, por pensar bobagem. Com pano e agua, removeu a
mensagem. Decidiu não dizer nada a sua mãe. Antes de dormir, foi
olhar as bonecas. Tudo estava em ordem.
Mais e mais mensagens
começaram a aparecer para ele; em forma de cartas ou nas paredes. As
vezes, os empregados ouviam barulhos e gemidos vindos do quarto de
Okiri, até que, as mensagens começaram a aparecer pela casa. Kameo
não podia mais esconder ou ignorar, quando as paredes da sala
estavam cobertas de tinta preta e uma mensagem " Odeio aquela
boneca!". Junto à frase, marcas de mãozinhas de criança. Um a
um, os empregados abandonaram os patrões.
A noticia se espalhou de
que a filha dos Sato havia voltado para assombra-los e todos pareciam
acreditar nisso. Todos menos Kameo e seu pai. Eles estavam certos de
que tinha sido uma brincadeira de mal gosto de alguns dos empregados.
A senhora Sato, no entanto não gostava nada disso. Numa tarde, ela
implorou para o filho queimar a boneca, pois ela não estava deixando
sua irmã descansar. A senhora Sato estava ruim da saúde, e o rapaz
não queria piorar sua situação, então, decidiu se livrar da
boneca naquela noite.
Quando entrou no quarto,
Kameo deu um pulo para trás: todas as bonecas pequenas estavam
amarradas pelo pescoço, penduradas no teto. O coração dele
acelerou ainda mais quando notou a boneca maior, de pé, no canto do
quarto, com o rosto virado para a parede... na verdade, duas delas.
No outro canto do quarto, estava uma segunda boneca, na mesma
posição, com a mesma roupa e cabelos, exatamente igual.
"Kameo" disse
uma voz. " Qual delas sou eu irmãozão? Você sabe dizer? qual
sou eu e qual é a impostora feita de madeira? Sei que sabe, não
sabe?" uma risadinha de criança preencheu o quarto, e logo em
seguida, a voz tomou um tom mais sério. " Não erre!".
O rapaz estava apavorado
de verdade agora; aquelas bonecas enforcadas sobre ele e aquelas duas
bonecas no canto do quarto... e a voz de Okiri... Olhou para as duas:
eram idênticas de costas. Fechou os olhos, tentou se concentrar e
caminhou ate uma delas. Quando estava perto o bastante para toca-la,
ouviu mais uma vez a voz: "Eu sabia que não iria me
decepcionar. Obrigada Kameo, eu te amo" e então, a boneca a sua
frente sumiu no ar. Soltou o ar que estava preso em seu peito e se
deixou chorar.
Do lado de fora, acendeu
uma fogueira para queimar a boneca. Finalmente tinha entendido os
sentimentos de Okiri,e poderia deixa-la descansar em paz agora. O
fogo consumiu rapidamente o corpo de madeira. Porém, enquanto
queimava, aqueles olhos de vidro, tão iguais aos dela, continuavam a
olha-lo...
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